segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Sob a bênção dos urubus

Passava um pouco das sete horas da manhã de domingo. Havíamos apenas iniciado a percorrer trilha do Banhados dos Pachecos, quando nosso pequeno grupo de observadores de aves se deteve ao lado de uma grande árvore, que nos seus galhos secos abrigava pelo menos uma dezena de urubus. Alguns os têm como aves de mau agouro, mas nós não podemos nem queremos acreditar nisto.


Enquanto nos aproximávamos, aos poucos, uma a uma, as aves começaram a abrir suas asas e as mantiveram estendidas sobre nós.


Justo neste instante, quando quase todos estavam atentetos aos urubus, surge ao longe, entre a vegetação, um cervo-do pantanal. Mamífero raríssimo por aqui, confinado apenas à área de preservação do Banhados dos Pachecos. Era o prenúncio de um grande dia de observação da natureza.



O Refúgio da Vida Silvestre mostrou, ao longo do dia, ser um importantíssimo reduto da vida selvagem. Resta ali uma das poucas áreas de transição entre o terreno seco e o banhado, justamente as áreas mais fáceis de serem drenadas para utilização da terra para a lavoura de arroz. Com o desaparecimento deste ambiente muito particular, várias espécies de animais que habitam este ecossistema também correm grande risco de extinção. Encontramos ali cinco espécies de aves que correm risco de extinção se o ambiente em que vivem continuar a ser devastado. São elas:

O Gavião-cinza
O Macuquinho-da-várzea
O Veste-amarela
O Guaracavuçu, retratado na foto a seguir:


E o Coleiro-do-brejo, esta pequena ave que aparece na foto a seguir, muito apreciada por criadores de aves em gaiola:


Além das raras aves citadas anteriormente, vimos mais 131 outras espécies. Algumas muito abundantes, outras mais raras, mas todas, de alguma maneira, dependentes daquele ecossistema.







O Refúgio da Vida Silvestre Banhado dos Pachecos não é importante só para mamíferos e aves. Animais e vegetais de inúmeras espécies necessitam desta área para garantir a continuidade da sua espécie.


Mau agouro certamente os urubus não trouxeram. Depois de vermos tantas coisas incríveis ao longo do dia, prefiro dizer que iniciamos aquele dia sob a bênção dos urubus.

Pela hora da morte

Os animais silvestres que correm risco de extinção em determinada área geográfica são classificados oficialmente na seguinte ordem crescente de acordo com a severidade da ameaça: vulnerável, em perigo, criticamente ameaçado e extinto. Entre os especialistas, no entanto, ainda há mais uma categoria informal, que poderíamos colocar entre os animais criticamente ameaçados e os extintos. São aqueles que estão "pela hora da morte".


O Cervo-do-pantanal, maior cervídeo da América do Sul, nunca foi abundante no Rio Grande do Sul e a sua ocorrência limita-se hoje somente a uma pequena área de preservação, a menos de uma hora de Porto Alegre, o Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos. São somente 2543 hectares e é o que restou de uma grande área de banhados que foi transformada sobretudo em lavouras de arroz. Não se sabe ao certo quantos indivíduos ainda existem no refúgio, mas estimam os biólogos que um Cervo-do-pantanal necessite ao menos 100 hectares para viver. Assim seria pouco provável que haja mais de 20 indivíduos vivendo ali e isto é tudo o que existe no estado do Rio Grande do Sul.


Uma fêmea apareceu enquanto andávamos por uma trilha. Ela nos percebeu, avaliou o risco e resolveu fugir. Fez muito bem. Ela tem a difícil tarefa de perpetuar uma espécie que está "pela hora da morte". Tomara que o ser humano permita que ela tenha sucesso.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

As previsões se confirmaram

Em janeiro deste ano postei um relato sobre a minha primeira ida ao canion Josafaz, quando entre outras coisas eu citava que era imperativo olhar para o lugar onde se pisa, pois as serpentes estão por lá. Voltamos ao Josafaz no feriado de 15 de novembro e já nos primeiros 20 metros de trilha na mata apareceu uma jararaca bem grande. Na foto a seguir o observador atento consegue ver a cabeça da cobra bem no alto e no centro da imagem. Ela evidentemente já havia sido importunada por nós e por isto levantou a cabeça, do contrário, no seu disfarce, seria quase impossível de ser avistada.



Este é o habitat dela, por isto fizemos algumas fotos e deixamos que ela seguisse o seu caminho.



Apenas 20 metros adiante, a segunda cobra. Segundo o biólogo Márcio Borges Martins, uma cobra cipó-listrada, só que esta não é venenosa. Mais algumas fotos e deixamos que ela também se refugiasse entre a folhagem e seguimos pela trilha, com a atenção dupli..., não, triplicada. Duas cobras nos primeiros minutos de caminhada era uma advertência mais do que evidente de que deveríamos ser cuidadosos.

No relato de janeiro também citava a grande quantidade de sons e cantos de aves que ouvíamos e que nem em sonho poderíamos imaginar de quem eram aquelas vozes todas. Ainda dizia que estimava que poderia haver em torno de 200 espécies de aves ali. Desta vez convidamos o nosso amigo e experiente ornitólogo da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, Glayson Bencke, para nos acompanhar. Ele, especialista que é em identificar aves pelo seu canto, desvendou inúmeros mistérios e em pouco mais de 48 horas dentro do canion, a lista de aves observadas somou 128 espécies. Se considerarmos que a nossa lista feita em janeiro tinha 84 espécies e que 21 delas não foram observadas agora, podemos dizer que já vimos 149 espécies e estamos mais próximos da minha previsão de que podem haver em torno de 200 no canion.


Imaginava eu, que pelo isolamento do local, novas espécies de aves pudessem ser encontradas ali. Novamente a previsão se confirmou com o registro da ocorrência de uma nova espécie de ave para o Rio Grande do Sul. Glayson gravou o canto da ave chamada Araponguinha-do-horto e reproduzindo a voz, a ave foi atraída e fotografada por ele, comprovando de forma indiscutível a existência da espécie no nosso estado.

Foto de Glayson A. Bencke
O piolhinho-serrano, ave recentemente descoberta no estado, que está para ser incluída na lista oficial das espécies do Rio Grande do Sul, também foi ouvido no Josafaz.
Além das aves, verdadeiros jardins suspensos sobre troncos de árvores caídas e flores das mais exóticas e desconhecidas espécies, formaram um cenário espetácular, em meio ao verde selvagem do canion Josafaz.



segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Corvo Branco

Corvo Branco é um dos nomes populares dado a uma espécie de urubu, o Sarcoramphus papa, também conhecido como Urubu Rei, que vive na região do Parque Nacional de São Joaquim, em Santa Catarina. Foi também o nome dado a uma das subidas da serra catarinense. Ao contrário da conhecida e famosa Serra do Rio do Rastro, situada ao sul do parque nacional, a Serra do Corvo Branco, ao norte, tem pavimento asfáltico apenas no trecho final da subida. Todo o restante do trajeto de subida e também toda a estrada na parte alta da serra ainda são em terra, embora as obras de pavimentação já tenham sido iniciadas.


As paisagens vistas a partir do alto da serra são espetaculares, mas antes de apreciá-las o viajante deve vencer o medo de subir o último trecho da estrada, muito íngreme e sinuoso, que desafia a habilidade e a coragem dos motoristas bem como as condições mecânicas dos veículos.


Para alcançar o topo da serra foi necesário realizar um grande corte na rocha, tido como o mais profundo corte em rocha do Brasil, com 90 metros de altura.



Em alguns anos provavelmente esta estrada estará totalmente pavimentada. Por isto quem ainda quiser subir a serra com um pouco mais de emoção tem que se apressar.

Falta "ordem na casa"

Agora já são 49 os surfistas que morreram presos a uma rede de pesca desde 1978 no litoral do Rio Grande do Sul.
A pesca é uma atividade milenar e como tal devemos respeitar quem a pratica respeitando a legislação ambiental, sobretudo se for para sustento próprio e da família.
O surf é um esporte novo, mundialmente praticado, faz parte da evolução humana, veio para ficar e portanto não poderá ser banido ou proibido nas nossas praias.
Fica claro que ambas as atividades terão que conviver em harmonia.
Para colocar ordem no país, nos estados e nos municípios nós elegemos governantes. A eles é dado um mandato público para que entre outras coisas regulamentem e disciplinem atividades. Após a primeira morte deveria haver uma ação enérgica e imediata para que a segunda não acontecesse. Agora já são 49, mais de uma por ano, será que não basta? Será que não está comprovado que o que foi feito até aqui não funcionou? Zonas demasiadamente estreitas para cada uma das atividades, falta de sinalização obrigatória delimitando estas faixas de atividade e falta de sinalização com boias das redes de pesca são na minha opinião os três maiores pecados cometidos até aqui. Além disto, assim como são fiscalizados os motoristas nas estradas, devem ser fiscalizados e autuados os usuários que não respeitarem um a faixa de atividade do outro.
Não adianta esperar soluções de pescadores ou surfistas. Cada um defenderá a sua posição. Eles podem colaborar com a solução, mas a ação deve ser das autoridades constituídas. Esta ação deve ser célere, enérgica, antes que mais alguns percam a vida de maneira estúpida, pela simples falta de atitude daqueles que elegemos para colocar "ordem na casa".

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Sempre algo novo

Voltar várias vezes, sempre de novo, ao mesmo lugar pode parecer ilógico. O observador mais atento, no entanto, vai descobrindo que cada oportunidade reserva novidades. Um lugar ao qual tenho ido com alguma frequência é a Cachoeira Pedras Brancas. Somente comparando as fotografias de cada visita é que nos damos conta de quanto muda o cenário a cada oportunidade. No início desta primavera, logo depois do equinócio, mesmo perto do meio dia, o sol ainda não ilumina a água da cachoeira, pois ela é orientada para o sul.



Os documentários da vida animal na TV induzem o telespectador a pensar que a observação da vida selvagem na natureza é algo fácil. Engana-se aquele que imagina que basta ir a um ambiente intocado para ver abundância de animais selvagens e engana-se mais ainda aquele que acha que é fácil registra-los em imagens. As diversas visitas na região do Rio Pedras Brancas revelou animais diferentes a cada oportunidade. No início de 2009 vimos uma Jacutinga, ave muito rara e por isto difícil de ser observada na natureza. Em setembro de 2010 vimos bandos de tucanos e agora em outubro um grande grupo de Quatis, que quando nos perceberam, fugiram trepando com incrível habilidade pelos galhos mais finos das mais altas árvores.


Como não poderia deixar de ser, a primavera também revela uma infinidade de flores na mata e ao longo dos rios. São tantas, tão variadas e tão coloridas que poderíamos passar horas fotografando. Aqui retrato apenas um exemplar da primavera de 2010, que impressiona pelo tamanho e pela exótica beleza.